Quem disse que as tradições europeias são as mais adequadas? Quem disse que a noção católica sobre o sofrimento, o pecado, o castigo e a morte, que está culturalmente impregnada dentro de nós, é o que faz mais sentido?
Como mãe, são essas as noções que quero passar ao meu filho? O meu marido é da América Latina e com a presença dele na nossa vida, mais cor, otimismo, alegria e novas perspetivas chegaram à família.
O tema da morte, pela realidade cá em casa, sempre esteve muito presente. As crianças têm uma forma interessante de olhar para estas questões. Para o meu filho é normal falar sobre isso e sempre acolhemos o tema com a maior naturalidade possível. Este tipo de abertura leva as crianças a sentirem e desvendarem os medos mais profundos dos que lhes são mais próximos. Um dia, quando tinha cerca de 3 anos, a falar sobre a morte disse-me: “mamã, não te preocupes porque se tu morreres, eu fico bem”! O meu coração tremeu com a espontaneidade de tal afirmação, como se ele me visse à transparência e tivesse acesso aos meus maiores receios e dúvidas.
Na minha família, como em muitas, a vida e a morte já se cruzaram muitas vezes. Mortes e nascimentos, celebrações de vida e morte acontecem em todas as famílias com maior ou menor frequência e previsibilidade. Provavelmente na tua também e se calhar não será necessário recuar muito no tempo.
Por isso decidimos incluir nos nossos rituais familiares, a propósito da noite do 31 de Outubro e o dia 1 de Novembro, a celebração do “Día de los Muertos”. Um dia de festa, de homenagem à família, que nos une a todos, os vivos e os que já morreram. Como bem o ilustra o filme da Disney “Coco” sobre a tradição no México: um dia para lembrar os que já cá não estão, as suas histórias, as suas vidas, o impacto que tiveram naquilo que somos hoje.
Um dia que celebra a vida, mesmo a vida dos que já foram, dos que já não estão. Um dia que funciona como “ponte” com esse outro lado.
Os rituais, com significado, cheios de simbolismo, são uma forma de autocuidado e ajudam a dar sentido à vida.
Por isso este ano, para além dos meus pais fazerem a passagem pelos cemitérios para honrar os nossos mortos, vamos construir com o meu filho uma espécie de altar, com flores, desenhos, fotos, muita cor e tudo o que a imaginação ditar, para que os mortos continuem vivos nos nossos corações, as suas histórias perdurem e nos ajudem a chegar mais longe
Não sei de ti, mas eu espero ser lembrada assim: pelo que vivi e pela maneira como o vivi.
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